Normalmente eu sempre começo os textos daqui com um título já pronto, abro o bloco de notas e a partir desse já sai o tal subtitulo e vou escrevendo como se tudo estivesse já pronto pra ser digitado.
Mas tem algumas semanas que isso não acontece e mais um tanto que eu não envio nada por aqui. Indo pelo romântico, poderia dizer que é um grande bloqueio criativo, mas na vida real mesmo foi um grande foco na minha saúde e tudo que estava acontecendo junto.
Já tinha comentado antes sobre minha endometriose, essa doença incrível que a proporção de pesquisas e tratamentos é (muito) inversamente proporcional à quantidade de mulheres que tem.
Agora em junho fez 1 ano que tive a confirmação do diagnóstico e comecei esse cuidado, intensificando algumas rotinas de não trocar o sofá pela academia, seguindo bonitinho o que a nutri recomendava e tentando reduzir meu nível de stress (o que é o infinitamente mais desafiador).
Dei uma olhada nas últimas edições e consigo ver ali esse grande tema sempre voltando, de como mudar essa visão que temos de que tudo é tão urgente e que PRECISAMOS fazer alguma coisa o tempo todo.
Esses dias estava falando com uma amiga e ela soltou uma frase que depois que ela foi embora continuou flutuando pela sala: que estamos sempre nos compensando por estar tão descontentes.
Calhou dessa fala vir justamente quando eu estava aqui nesse grande desafio de ter caído em um clichê que eu sempre via e só descobri que é bem verdade porque passei: repensando minha vida toda depois de uma cirurgia complexa.
Pois é, comemorei 1 ano de diagnóstico em uma sala cirúrgica com uma equipe médica fazendo a festa dentro de mim e queimando muito mais lesões de endometriose do que sabíamos, acordando da anestesia pra descobrir que ainda ia passar mais um tempo no hospital e que minha licença ia até o limite dos 15 dias, já que na real eu precisaria de pelo menos uns 40, descobrindo que sentar e levantar que antes parecia tão simples eram pequenas vitórias com aquele tanto de dor.
Acabou sendo um corte seco de uma semana estar fazendo duas aulas seguidas de spinning pra não conseguir dar 10 passos do meu quarto até o sofá (que precisou de muitos outros dias pra que eu conseguisse sentar e levantar sozinha dele, preferindo muito mais aquela cadeira de madeira que meu avô fez e que tem essa firmeza que ajudava demais com os apoios). Descobri nesses dias todos que meu corpo tem limites diferentes dos que eu pensava e que talvez eu mesma já soubesse, mas insistia em seguir ultrapassando todos como se fosse o papa léguas correndo do coiote.
Foi treta e ao mesmo tempo foi bom pra ver onde não quero mais estar. Shonda Rhimes trás em “O ano em que disse sim” desse jeito bem claro:
E me lembrou também de um outro livro que eu estava há semanas pra ler e que quando estava aqui no finalzinho dos medicamentos, já sentindo que conseguia começar a pensar normalmente, li inteiro em uma manhã de domingo no sofá: Paixão Simples da Annie Ernaux. É do Clube do Livro da
e nossa, são 60 páginas que eu achei incrível como ela trouxe aquele tanto de sentimentos.Acabou me lembrando do meu manifesto desse ano de ter o caminho aberto para os Desejos e lendo sobre toda aquela entrega dela pra essa paixão fiquei aqui pensando na delícia que é assumir isso tudo sem toda uma culpa ou vergonha.
Quantas coisas deixamos de fazer por uma expectativa que nem é nossa? Ali temos ela contando sobre uma paixão que viveu com um homem casado mas que nem sabemos tanto sobre esse homem, terminei pensando no tanto de paixões que eu tive que pareciam tão absurdas na época mas que bom que vivi!
Acho que encontrei o título: Sim! (Que fiquei com vontade de colocar “sim! sim! sim!” mas ai faria referência a uma música que não tem nada a ver haha)
Mas aqui tem um grande truque: qual sim leva pra esse caminho melhor? Provavelmente o sim que vai começar a incomodar outras pessoas porque pra elas vira um não. Sim pra cancelar porque estou cansada e preciso me recuperar, sim pra parar antes do meu limite, sim pra passar horas lendo livros sem uma culpa de que deveria ser mais produtiva ou estar estudando. Sim para subir uma ladeira sem correr, tá tudo bem andar mais devagar e conseguir olhar para os lados.
E sim também pro tanto de sinais que eu já vinha dando dessa mudança quando esse ano lancei esse manifesto pelo desejo e de seguir abrindo esses caminhos.
Pra fechar, uma das obras da Nádia Taquary da exposição Ộnà Irin: Caminho de Ferro que logo no texto de abertura do Muncab onde Amanda Bonan, Ayrson Heráclito e Marcelo Campos já trazem que:
A mostra Onà Irin: caminho de ferro elege a espacialidade de um fluxo ferroviário intenso como metáfora da dinâmica vida. Linhas de trem se multiplicam em infinitos destinos, perspectivas e encruzilhadas, celebrando a poética do movimento, da comunicação (Exu) e da tecnologia (Ogum). É nesse espaço que Exu e Ogum habitam, vivem e se alimentam.
Então vamos movimentar? Aproveitar que estamos no meio do ano e ainda temos muito tempo.